Estou acostumada com meus infortúnios. Todos os meus amores são caminhos involuntariamente solitários, que percorro na companhia de minha mente, em pleonasmo, com alguns bons ouvintes que evitam que minha boca seque em horas de silencio. Lavo minhas mãos sujas de tinta das cartas que te escrevo, em momentos de epifania. Cartas que realmente espero que nunca sejam lidas. Apenas aguardo.
Digo isso por que as escondo para que não leia, pois acho que nem todos estão preparados para ouvir o que tenho a dizer, e tenho medo que corra assustado dos meus olhos sofridos escritos em tinta seca, preto borrado.
Se tu fores embora, ou eu, ou nós, dessa pequena cidade grande, e não mais nos encontremos subindo Bahia, descendo floresta ou desbravando o império, espero também que saiba que nos últimos meses sua falta foi a dor mais desestruturada e desacostumada que já senti, em meus tempos desconexos, e vai continuar sendo, mesmo sem sentido. Espero que seu ano novo seja melhor que esse velho de bengala que deixamos de lado, melhor que esse ano pior, por que se esse foi o melhor da sua vida, já não há mais motivos para se viver.
Espero, enfim, um nós, mas esperar sentada talvez esteja me cansando, e a boca que só sente o amargo quer de novo sentir teu gosto. Espero que essas poucas horas desse ano velho talvez te tragam pra mim, não de volta, por que não houve entre nós um caminho de mão dupla. Eu quero ter a oportunidade de te dizer o que nunca foi dito, quero ter a oportunidade de ver o teu rosto na luz do sol entre uma noite e outra, por entre as cortinas. No mais quero te ter pra mim como nunca foi possível, por que se sobrevivi a esses tempos de tempestade, o impossível já não me parece tão espacial assim.